O que será dos seus direitos?

A ideia não é nova, mas, desta vez, saiu do discurso e ganhou forma. Embora muito pouco ou quase nada tenha sido ainda divulgado pela mídia sobre o assunto, desde 26 de maio foi apresentado no Congresso Nacional, pelo deputado Sílvio Costa (PTB-PE), o Projeto de Lei (PL) nº 1463/2011, que institui o Código do Trabalho. Pela repercussão econômica e social que pode causar, trata-se de proposta que carece de muito debate para não trazer mais prejuízos do que benefícios ao trabalhador brasileiro.

Segundo o autor do PL, que admite urgente interesse na aprovação da matéria, o objetivo “não é propor uma revolução na legislação trabalhista, mas reduzir a complexidade e o anacronismo da legislação atual e permitir que empregados e empregadores possam negociar condições de trabalho diferentes da lei, com todas as garantias previstas na Constituição Federal”. Na essência, ele reconhece que o propósito é o mesmo que já permeou todas as tentativas e promessas (ou ameaças) de flexibilização da legislação trabalhista no Brasil: fazer prevalecer o negociado sobre o legislado.

“Flexibilizar, garantindo-se direitos mínimos, vem ao encontro da tendência mundial de afastamento do intervencionismo e protecionismo exacerbado do Estado, dando força à composição entre as partes como forma reguladora das relações de trabalho. Os acordos entre sindicatos e empresas devem ter força de lei”, defende o parlamentar, que alega a necessidade de “a cooperação substituir o confronto nas relações trabalhistas”.

O Código do Trabalho sugerido apresenta 280 artigos divididos em quatro grupos que tratam: 1) do Direito Individual do Trabalho (normas gerais e especiais de proteção, contratos individuais, trabalho avulso e terceirização); 2) do Direito Coletivo do Trabalho (organização sindical, convenções e acordos coletivos, negociação coletiva e direito de greve); 3) das Penalidades; e 4) das Disposições finais e transitórias.

A proposta em tramitação na Câmara revoga 36 dispositivos legais que tratam de direitos trabalhistas, entre eles 407 dos 922 artigos da atual Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), 27 leis e três decretos-leis, além de artigos de outras leis. O Código do Trabalho, se aprovado como na proposta original, não se aplicará aos servidores públicos que estejam sujeitos a regime jurídico próprio (os chamados estatutários).

Força Sindical promete agir para barrar tramitação de Projeto ainda no início

A Força Sindical não dará trégua até que seja barrada a tramitação do Projeto de Lei nº 1463/2011. A informação é do presidente do Fórum das Centrais Sindicais no Estado do Ceará (FCSEC), Raimundo Nonato Gomes, que também preside a Força Sindical no Estado. Ele avalia que a proposta apresentada na Câmara pelo deputado Sílvio Costa (PTB-PE) quer, mais uma vez, tolher o direito do trabalhador. “Vamos combater este tipo de proposta. A Força Sindical está a par do projeto. Já estamos nos articulando para combatê-lo”, diz.

Raimundo Nonato Gomes enfatiza que os trabalhadores não aceitam que tentem mexer em direitos como férias, exames médicos ou quaisquer outros duramente assegurados na legislação. “Isto não pode acontecer. Para nos favorecer, ninguém apresenta uma nova proposta, mas, se é para nos prejudicar, também não deixaremos. Faremos tudo que for possível para que a tramitação não passe nem na primeira comissão. O movimento já está sendo articulado”.

O dirigente da Força Sindical no Ceará alerta que os trabalhadores têm de se preocupar e estar mobilizados para que o projeto não se torne mais um aprovado “na calada da noite”. Sobre o argumento do deputado de que o Brasil precisa flexibilizar a legislação trabalhista para assegurar condições de competitividade, ele afirma que a preocupação do Brasil e dos demais países que sintam prejudicados deve ser no sentido de pressionar os organismos internacionais a cobrarem de países como a China a aprovação de políticas e de legislação de proteção aos seus trabalhadores, em vez pregar a eliminação de direitos onde já estão assegurados. “Porque a dignidade deve ser garantida ao trabalhador daqui de de todos os Países”, justifica.

Comissão de Direito Sindical da OAB-Ceará discutirá proposta

Debate foi agendado para sexta-feira, dia 29/7, a partir das 14h30, na sede da OAB

A recém-criada Comissão de Direito Sindical da OAB-Ceará discutirá, na próxima sexta-feira, dia 29/7, às 14h30, no Plenário da Sede da OAB (Rua Lívio Barreto, 668 – Joaquim Távora), o Projeto de Lei nº 1463/2011, que pretende instituir o Código do Trabalho. O debate terá início com exposição do advogado sindicalista Carlos Chagas, seguido pelos debatedores Francisco Gérson Marques de Lima (procurador regional do Trabalho) e Clóvis Renato Costa Farias (advogado e secretário-geral adjunto da Comissão). Coordenará a mesa o presidente da Comissão, advogado Thiago Pinheiro de Azevedo.

A Comissão também abrirá espaço para que demais interessados exponham suas opiniões. Após o debate, serão definidos os encaminhamentos que devem incluir a elaboração de documento conjunto com a posição da entidade sobre a proposta, a ser enviado ao Congresso Nacional.

Clóvis Renato afirma que, particularmente, já estudou o Projeto e considerou-o negativo. “Em vez de trazer avanços, trará um retrocesso para os trabalhadores e para o processo coletivo. Em razão disso, será preciso uma mobilização por parte dos trabalhadores e de suas entidades representativas para que o PL não chegue nem a tramitar”, defende.

O advogado aponta entre as mudanças mais graves sugeridas pelo projeto a retirada/revogação do artigo 9º da Consolidação das Leis do Trabalho, que trata da nulidade dos atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar os preceitos contidos na CLT. Também menciona a retirada da parte referente ao processo do Trabalho e ao processo coletivo e a introdução da CLT, que define empregado e empregador.

“Apesar de toda a discussão hoje existente, o projeto não se adequa à idéia de liberdade sindical. O Código também já nasceria em desacordo com todas as discussões pela redução da jornada de trabalho, tendo em vista que mantém em seu texto a mesma previsão das 44 horas semanais hoje existente”, acrescenta Clóvis Renato.

Autor da proposta é empresário da educação e vê protecionismo exagerado nas leis trabalhistas

Sílvio Serafim Costa, deputado federal eleito pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) pernambucano, é natural de Rio Formoso (PE). Aos 54 anos, é empresário da educação, segundo seu perfil disponível no site da Câmara dos Deputados, onde exerce seu segundo mandato. O PTB é seu segundo partido. Antes, foi filiado ao PMN (2003-09). Já foi vereador e deputado estadual.

Na justificativa do PL 1463/2011, ele argumenta que “o protecionismo exagerado da legislação laboral é hoje um óbice ao dinamismo do mercado de trabalho, além de contribuir para as perspectivas de entrada no mercado de trabalhadores já discriminados como mulheres, jovens e idosos”. “Se a CLT foi criada com a preocupação de proteger o trabalhador, de fato, em muitos casos, ela deve continuar protegendo. Mas há que se permitir que o empregado, sabedor dos termos mais vantajosos do seu contrato de trabalho, possa abrir mão de alguns direitos me favor de um conjunto de benefícios”, defende.

O deputado insiste que, hoje, “a inflexibilidade para se contratar é o mais grave problema da legislação trabalhista”. “Isto impede a competitividade das empresas. Como a concorrência dos mercados internos e externos é cada vez mais acirrada, e só vence quem oferece o menor preço, as empresas não hesitam em transferir fábricas para países onde o custo de produção é baixo”, enfatiza. Ele acrescenta que cabe ao legislador criar ou adaptar a legislação às necessidades e exigências da sociedade e que, embora muitos dos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada em 1943, ainda estejam em vigor, muitos deles estão “claramente ultrapassados”.

Advogado sindicalista avalia que Projeto não oferece a atualização necessária

Para o advogado sindicalista Carlos Chagas, o Projeto de Lei nº 1463/2011, que propõe a criação do Código do Trabalho, desperdiça a oportunidade de promover os necessários reparos para atualizar regras voltadas à salvaguarda da dignidade daquele que trabalha na atual sociedade pós-industrial (“informacional”), como também de aperfeiçoar fundamentos do Direito Coletivo do Trabalho. Ele cita, por exemplo, que a capacidade para o exercício das prerrogativas sindicais venha a ser decorrência direta da legitimidade, aferida a partir da constatação de índices de representatividade, algo que o projeto não aborda nem superficialmente.

Segundo Carlos Chagas, o PL 1463 mantém eixos estruturais da atual CLT, contendo apenas pontuais alterações. “No que tange ao foro sindical, ou seja, às garantias atribuídas à organização sindical, repare-se que o referido projeto de lei conserva a caduca concepção de restringir tais marcos garantidores àqueles que ocupam cargo de direção ou representação sindical, o que consiste em um reducionismo lamentável, uma vez que os atos antissindicais se operam em desfavor não só da pessoa dos dirigentes sindicais, além de evidenciar níveis de gravidade distintos que não podem ser ignorados na futura Legislação do Trabalho, porque uma de suas pedras angulares deverá ser a Liberdade Sindical”, diz.

Ele lamenta, também, que o projeto de lei desperdice a oportunidade para ajustar os limites da estabilidade no emprego em favor dos dirigentes sindicais, fazendo com que a mesma fosse assegurada em número proporcional à extensão da base representada, propiciando, dessa maneira, a aproximação da legislação à realidade. “Por tudo isso, entendo que o referido projeto nada mais é do que um ponto de partida, cabendo aos segmentos sociais oferecer sua contribuição de maneira que o Código do Trabalho, se vier a ser aprovado, seja a confirmação dos princípios que estão na Constituição Federal e, ao mesmo tempo, a síntese, senão perfeita, a mais aperfeiçoada, das aspirações havidas na sociedade”, observa Carlos Chagas.

O que deve continuar, conforme a proposta do Código do Trabalho

* Jornada de trabalho
A duração normal do trabalho não excederá oito horas diárias e 44 horas semanais.

* Proibição de locaute
Empregadores não podem ter a iniciativa de paralisar atividades com objetivo de frustrar negociação ou dificultar atendimento de reivindicações dos empregados.

* Atividades essenciais em caso de greve
Embora revogue a Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, o PL nº 1463/2011 define como serviços ou atividades essenciais a mesma lista indicada pela chamada Lei de Greve. A obrigação de comunicar a empregadores e usuários a decisão de deflagração de greve nos serviços essenciais continuará sendo de 72 horas de antecedência e, nas demais atividades, 48 horas. Todas as previsões da Lei de Greve estão reproduzidas no PL.

* Trabalho infanto-juvenil
Código mantém previsão da Constituição e do Estatuto da Criança e do Adolescente de que é proibido qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz (a partir dos 14 anos). Uma atecnia, porém, consta do Projeto: ao definir adolescente como trabalhador de 14 a 18 anos, o PL proíbe a estes o trabalho noturno, perigoso ou insalubre e em locais ou serviços prejudiciais à sua formação ou ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social, atividades que, pela legislação atual, são proibidas somente até 17 anos.

* Hora noturna
Continua correspondendo a 52 minutos e 30 segundos e se aplicando ao trabalho realizado entre 22 horas e 5 horas do dia seguinte. Mas a remuneração passa a ser superior em pelo menos 25%, em vez dos 20% previstos na CLT.

* Intervalo interjornada
Continua sendo de, no mínimo, onze horas consecutivas para descanso.

O que muda, conforme a proposta do Código do Trabalho

* Sobreposição dos acordos
O Projeto de Lei (PL) nº 1463/2011 prevê, logo de saída, que o contrato individual de trabalho rege-se pelas normas fixadas entre as partes, respeitados os direitos mínimos assegurados no Código do Trabalho e na Constituição. Significa que, diferentemente do que ocorre hoje, será possível suprimir direitos previstos em outras lei, se houver acordo entre as partes neste sentido.

* Hora extra
Limite diário de horas suplementares continua em número não excedente de duas e a remuneração continua sendo em pelo menos 50% superior à da hora normal, mas o PL dispensa acordo escrito entre empregador e empregado ou contrato coletivo de trabalho, o que constava na CLT.

* Férias
Os trinta dias de férias a que se tem direito após cumpridos 12 meses subseqüentes de trabalho poderão ser parceladas em até três períodos, desde que requeridos pelo empregado. Hoje, são concedidas em um só período e, excepcionalmente, em dois períodos.

* Intervalo intrajornada
A CLT prevê que, em qualquer trabalho contínuo com duração superior a seis horas, seja concedido intervalo mínimo de uma hora e máximo de duas horas. O PL, porém, não fixa períodos mínimos e máximos, deixando que a duração do intervalo seja fixada em acordo escrito ou convenção ou acordo coletivo de trabalho.

* Exames médicos
A CLT prevê explicitamente a obrigatoriedade de realização de exames médicos admissionais, periódicos e demissionais. O PL diz, genericamente, ser obrigatório exame médico, conforme instruções expedidas pela autoridade competente.

* Meio ambiente de trabalho
O PL resume a um artigo o cuidado que as empresas devem ter com ambiente, condições, equipamentos, materiais e métodos de trabalho, condicionando-os às normas expedidas pela autoridade competente. A CLT dedica 19 artigos (do 170 ao 188) para detalhar as obrigações do empregador em relação ao local de trabalho, especificando normas relativas à iluminação, conforto térmico, instalações elétricas, movimentação, armazenagem e manuseio de materiais, máquinas e equipamentos, com atenção especial a caldeiras, fornos e recipientes sob pressão.

* Voto em assembléia sobre convenções e acordos
O PL inclui a previsão de que, independentemente de filiação, todos os representados pelo sindicato podem participar das assembléias que tratem de convenções e acordos coletivos e nelas votar. Hoje a CLT é omissa, deixando as limitações a cargo dos estatutos das entidades sindicais. O PL também define que, quando mais favoráveis, as condições fixadas em convenções prevalecerão sobre as estipuladas em acordos coletivos.

* Licença-“maternidade” para o pai
Em caso de morte da mãe ou de incapacidade física ou psíquica, o pai terá direito à licença de 120 dias para cuidar do bebê. O PL também prevê que, havendo decisão conjunta dos pais, após os primeiros quinze dias do parto, o pai pode ter licença estendida por transferência, por parte da mãe, do respectivo período e direitos a que ela optar por renunciar. A proposta estabelece, ainda, que a proibição de dispensa arbitrária ou sem justa causa, o direito à licença-maternidade e a local apropriado para guarda e assistência dos filhos até um ano de idade (manutenção de creche ou pagamento de auxílio) se aplicarão também ao empregado adotante solteiro e aos que, vivendo em união homoafetiva, adotem criança (neste caso, o casal decidirá que parceiro usufruirá dos direitos).

* Nulidades
O PL exclui a previsão contida no artigo 9º da CLT, que trata das nulidades de atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na legislação. As nulidades são objetos de grande parte das ações judiciais trabalhistas.

* Processo coletivo
A proposta também revoga (exclui) diversos artigos que tratam do processo coletivo de trabalho (que disciplinam o rito de tramitação das ações judiciais envolvendo grupos de trabalhadores).

* Conceito de empregado/empregador
Contido na parte introdutória da CLT, a definição (critérios) de quem é considerado empregado e quem é classificado como empregador deixa de existir na proposta do Código do Trabalho.

Tags: #MPT, #DireitoSindical, #JornadadeTrabalho, #OAB

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